quarta-feira, 13 de abril de 2016

Relacionamento II

Relação sem padronização

Image courtesy of David Castillo Dominici at FreeDigitalPhotos.net

Ao longo do tempo, a sociedade parece ter desenvolvido a necessidade de criar estereótipos a todos nós, cada indivíduo tem de ser devidamente colocado dentro de uma caixa especificamente rotulada, isso começa antes mesmo de  nascermos: o rótulo mulher/homem nos é entregue antes de nossa constituição social. 
A não capacidade de enquadrar e identificar cada pessoa ou situação parece gerar um profundo incômodo e até revolta em determinados seres humanos e grupos.
A necessidade social de estereotipar e rotular tudo que é possível causa um verdadeiro imbróglio quando falamos em relacionamentos, especialmente ao se considerar as inúmeras possibilidades de relacionamentos que a cada dia ganham força, evidência e adeptxs. A história humana criou uma série de regras e necessidades coletivas, entre elas está o envolvimento afetivo e obrigatório por pessoas, e pessoas de sexo oposto, porém, a complexidade humana é infinitamente maior do que as regras reducionistas ditadas pela sociedade; a forma de nos relacionarmos não deve ser pautada por receitas conservadoras e falidas,  isso já foi assunto em outro momento aqui, inclusive.
Da mesma forma que o processo de socialização, desde muito cedo, nos mostra que precisamos obrigatoriamente ser pessoas cisexuais, heterossexuais, monogâmicas e seguir os modelos e padrões impostos ao longo da vida, também nos diz a maneira como devemos nos relacionar afetivamente com o outro. Mas e quando há um questionamento deste modelo e destas regras? E quando o individuo não quer se relacionar de uma maneira 'convencional'?
Sempre que lidamos com situações que pressupõem um questionamento dos padrões vigentes e aceitos como "normais", precisamos estar dispostos ao conflito, à discussão e à luta, pois ir contra uma corrente estabelecida há milênios, não costuma ser algo de muita facilidade. O texto passado falava sobre relacionamentos gays e a não categorização do envolvimento afetivo, especialmente por ser impossível estabelecer regras ou receitas para tratar de pessoas essencialmente diferentes, em situações totalmente variadas; pois bem, é preciso mais que nunca falar sobre as possibilidades de se relacionar e questionar o modelo tradicional monogâmico e heterossexual. Não se trata, no entanto, de uma tentativa de desconstruir ou invalidar essa ou aquela forma de relacionamento, pelo contrário, apenas um intento de mostrar a diversidade possível nas maneiras de se relacionar e garantir o respeito às decisões individuais.
Muito se fala sobre a instituição do relacionamento monogâmico como uma imposição estranha ao humano, que é por natureza, na visão de alguns, um ser de relacionamentos múltiplos, sendo muito mais espontânea a possibilidade de não se fechar de forma imposta. Ora, não é difícil encontrar pela internet ou mesmo em nosso convívio, estatísticas, dados e relatos de relações fechadas em teoria, cujos envolvidos mantêm casos extraconjugais. Será que há certa dose de hipocrisia?
A instituição dos relacionamentos prevê inúmeras regras, preceitos, valores e uma moral conservadora. Ao longo da vida, aprendemos a sonhar, desejar e estabelecer o relacionamento com o outro: o namoro, o noivado ou o casamento, sem nunca questionarmos o porquê da construção, da forma e mesmo o porquê de necessariamente termos que viver essa aspiração social. Podemos não querer um namoro, um noivado ou mesmo o casamento em nossa individualidade, contudo, a sociedade não aceita sob hipótese alguma tal opção. Então, como falar em relacionamento aberto, por exemplo, nesse contexto conservador?
O relacionamento aberto, o amor livre, o polimor, dentre tantas outras possibilidades, vem a cada dia ganhando espaço e ressonância entre pessoas, que desde algum momento passaram a questionar as relações tradicionais, encarando-as como problemáticas, hipócritas e inviáveis; não a relação em si, mas sim o discurso que as constrói e as cristaliza.
A cada dia que passa, caminhamos para a construção de uma sociedade que se pautará pela diversidade, na qual não deverá haver outro caminho, senão aquele do diálogo, debate, reflexão e respeito; ao propor discussões como essa não pretendemos invalidar ou deslegitimar as variadas formas de relacionamentos possíveis, abertos ou monogâmicos, pelo contrário, trata-se na verdade de tentativas de evidenciar a diversidade, a diferença, para que com o conhecimento, cresça o respeito; para que as pessoas possam saber que ao contrário do que elas aprenderam, há inúmeras formas de se relacionar, de apaixonar-se e de se envolver. 
O afeto é por natureza livre, não pode haver medida ou regras com o objetivo de padronizá-lo ou categorizá-lo.

quarta-feira, 23 de março de 2016

Relacionamento I

 Você já ouviu alguém dizer que relacionamentos gays não duram? Que homens são promíscuos e sexualizados demais para viverem relacionamentos estáveis, monogâmicos ou não? Há diversos discursos dentro e fora do meio LGBT tentando sustentar e reproduzir tal visão. Vamos falar sobre isso? Será que relacionamentos gays são, naturalmente, inviáveis?

Os Instáveis Relacionamentos Gays

Adapatado: Image courtesy of Simon Howden at FreeDigitalPhotos.net

Há uma ideia, equivocada a nosso ver, que rodeia o imaginário de  diversas pessoas, inclusive homossexuais: trata-se de um constatação duvidosa dizendo respeito aos relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo, especialmente entre homens, a de que esse tipo de relação não tem futuro e de que está, inevitavelmente, fadada ao fracasso.
Em busca simples pelo Google é possível encontrar uma série de relatos, artigos, listas, dentre outros materiais tratando sobre o tema, o Lado Bi  traduziu um artigo do tumblr da revista Revolutionary que lista o erros mais comuns nos relacionamentos gays; o ChilliWiki publicou uma matéria em que expõe 05 razões que explicam o porquê  de os relacionamentos gays não durarem; caso procuremos um pouco mais, também encontraremos vídeos em canais no Youtube tratando do tema, posicionando-se favorável ou contrariamente a tal "constatação".
A questão da duração de relacionamentos precisa ser drasticamente problematizada. A nós, parece fazer pouco sentido, primeiramente, debater o quanto um relacionamento deve durar para ser considerado estável, ou mesmo utilizar um tipo de relacionamento como parâmetro, no caso heterossexual, para padronizar ou balizar os outros tipos de relacionamentos possíveis, na verdade fazer isso é uma forma de reproduzir ainda mais preconceito.
Muito se fala, em diversos meios, que os homens gays não conseguem se firmar em relacionamentos por diversas características peculiares do sexo biológico masculino, características essas bastante problemáticas. Fala-se que homens tem uma quantidade explosiva de hormônios que os fazem ter um desejo sexual "astronomicamente" maior em relação às mulheres; que homens não conseguem manter-se fiéis, por mais que gostem verdadeiramente de suas/seus parceirxs; que gays são demasiadamente promíscuos e hipersexualizados para relacionamentos longos ou monogâmicos, não que a monogamia seja o modelo ideal ou necessário, longe disso; que a disponibilidade e facilidade de encontros casuais entre homens superam a possibilidade de um relacionamento estável; que os modelos estruturados que prendem heterossexuais em relacionamentos, não existem para os gays, dentre tantas outras justificativas e argumentações problemáticas, no mínimo, que já ouvimos ou lemos por aí.
Em primeiro lugar, é preciso esclarecer que relacionamentos são um projeto que envolve duas ou mais pessoas e que dificilmente haverá receitas ou modelos de sucesso a serem seguidos, pois cada individuo responde de maneira diferente na circunstância de um envolvimento afetivo, então, esqueça tudo que você aprendeu nos contos de fada, na novela das oito que agora é das nove, mas começa nove e meia quase dez, o que leu nos testes das revistas "teen's", que ensinavam como agarrar o "bofe" em cinco passos infalíveis, ou detectavam qual integrante do "Backstreet Boys" e agora do "One Direction" mais combinava/combina com você.
Estar em um relacionamento envolve uma série de variáveis e disposições de ambas as partes envolvidas, um bom sinônimo para relacionamento é a cessão, pois antes do amor, companheirismo, paciência, respeito e empatia, os envolvidos deverão estar dispostos a cederem em algumas circunstâncias, senão, os pontos de discórdia tornar-se-ão maiores que qualquer coisa boa que exista.
A nossa sociedade, heterormativa, instituiu ao longo de séculos o ideal de relacionamento e constituiu-se sob o preceito da indestrutibilidade da família, a qualquer preço. Você que nos lê, provavelmente conhece ou já ficou sabendo de determinado casal heterossexual, que já não tem uma vida, efetivamente, conjugal, mas que por diversas circunstâncias não conseguem colocar fim a uma relação acabada há tempos; ou mesmo de casais que traem, muitas vezes, de forma clara; dizer que um relacionamento desse tipo é duradouro ou usá-lo como forma de comparação é, indiscutivelmente, um equívoco.
Falar que relacionamentos gays não duram ou que homens gays são promíscuos e hipersexualizados (O que é promiscuidade mesmo?), é o mesmo que dizer que todas as relações heterossexuais são perfeitas, duradouras e baseadas no respeito mútuo, o que está bem longe de ser verdade. É preciso o entendimento de que o ser humano engana, ludibria, desrespeita, mas que também ama, espera e pode ser fiel, sem com isso generalizar a humanidade, pois já sabemos, ou ao menos deveríamos saber, que generalizações precisam ser usadas com grande cautela.
  Há pesquisas e artigos que desmistificam a crença popular de que os homens têm um desejo sexual superior ao das mulheres. A grande verdade é que, por séculos, as mulheres foram e ainda são reprimidas sexualmente, elas não podem falar, desejar ou pensar em sexo. O sexo para as mulheres está amplamente relacionado a algo sujo e errado, tanto que os xingamentos destinados a elas, na maioria das vezes, estão ligados ao sexo; além disso, mulheres passam pela menopausa, momento de mudanças hormonais e de queda brusca do apetite sexual, fase não vivida pelo homem. Esses fatores, dentre tantos outros servem de argumento a tese do maior desejo por parte dos homens, que também serve para justificar o fato de que eles precisam buscar satisfação na rua, já que têm necessidades físicas e hormonais astronômicas.
Perceba tratar-se de construções sociais, poucas das quais têm verdadeiro respaldo científico, têm o mesmo fundamento e objetivo do tipo de construção que vai dizer que mulheres amadurecem mais cedo que os homens (sem colocar em discussão as constatações biológicas desse fato), fornecendo a justificativa ética e moral para que homens mais velhos possam relacionar-se com mulheres mais jovens, ou mesmo muito mais jovens sem as condenações que ocorrem, por exemplo, quando é a mulher que se envolve com um rapaz mais novo.
São  questões amplas que perpassam qualquer tipo de relacionamento, os dados que podem dizer sobre a durabilidade dos casamentos entre pessoas do mesmo sexo ainda são escassos, talvez no futuro tenhamos alguma medida. O que precisamos entender é que as pessoas estão tornando-se mais conscientes e coerentes, estão menos dispostas a sofrer em relações abusivas e mortas na prática. Não devemos confundir liberdade e direito a seguir os caminhos que acreditamos ser melhores, com instabilidade ou falta de capacidade em manter-se em um relacionamento, aberto ou fechado. Mulheres e homens podem ter apetite sexuais variados, tal característica não está, necessariamente, ligada ao sexo biológico.
Ao refletir, percebemos o quanto estas afirmações e pensamentos são machistas, o homem privilegia-se a todo momento, ele pode estar com quem quiser dentro e fora de seu relacionamento, caso ele esteja em um. Ao longo dos anos o discurso que sustenta algumas crenças que, por vezes, parecem tornar-se verdades inquestionáveis, são fruto justamente do motor que pretende a todo momento subjugar determinadas pessoas na sociedade.
Precisamos falar e fazer reflexões mais profundas sobre a homossexualidade, a bissexualidade, sobre os relacionamentos e sair do terreno do senso comum ou da mania em tomar padrões heterossexuais como tábua rasa de comparação. Relacionamentos gays não duram menos ou mais. Quando o assunto é relacionamento e sua durabilidade, precisamos ter certeza de apenas uma coisa: Um Relacionamento, seja ele qual for, deve durar o tempo que tiver de durar, enquanto for bom e saudável para os envolvidos.

sexta-feira, 11 de março de 2016

Mulheres

Durante esta semana o Alternnativa deu espaço para que mulheres dissessem a nós "O que é ser Mulher?". Maíra, Talita, Fran, Karina e Tatiana, compartilharam conosco um pouco de sua experiência e luta enquanto mulheres. Aproveitamos para agradecê-las imensamente por nos ter prestigiado com seus textos, pensamentos, vídeos e dizer, longe dos clichês da moda, que todo dia é dia de Mulher sim, todo dia tem de ser dedicado à luta contra o machismo, contra a misoginia, o patriarcado, todo dia precisa ser uma busca incessante por sororidade. Para fechar esta primeira série especial aqui no Alternnativa, chamamos Tatiana Venâncio para nos responder a pergunta que abriu nossa semana: O que é ser Mulher?
Tatiana é negra, tem 29 anos e mora na zona Sul da capital. Na contramão do racismo e dos descaminhos que as mulheres negras ainda percorrem em nossa sociedade, graduou-se em Biologia por uma instituição de renome, é mestre em Ciências pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e pretende ingressar no programa de doutorado da Faculdade de Educação, da mesma universidade.
Tatiana faz questão de afastar o discurso da meritocracia para falar de sua trajetória acadêmica e pontua que sua visão de mundo, especialmente em relação à mulher, mudou sensivelmente nos últimos anos.

"O que é ser Mulher?" por Tatiana Venâncio

Image courtesy of africa at FreeDigitalPhotos.net

"Muito difícil expressar com palavras o que é ser mulher. Se essa pergunta tivesse sido feita há 15 anos minha resposta seria completamente diferente. Até minha adolescência eu acreditava que as mulheres tinham de desempenhar somente algumas funções na sociedade, acreditava realmente que algumas profissões eram “destinadas” às mulheres e outras “destinadas” aos homens.
Minha visão com relação ao meu gênero era extremamente limitada. Eu via os homens ao meu redor trabalhando fora e não fazendo quase nenhum trabalho doméstico e as mulheres cuidando de todos os afazeres da casa trabalhando fora ou não. Havia uma divisão muita clara.
Hoje estou rodeada de mulheres fortes que trabalham nas mais diversas profissões. Que lutam por melhores cargos, por melhores condições de vida. Que têm muitas outras preocupações sociais além de casamento e filhos. Hoje sei que ser mulher é a convivência diária com dores e deleites, vulnerabilidade e força, medo e coragem. É superação diária. É ter atenção redobrada na rua, sempre que chega a noite após o trabalho ou após a cerveja com as amigas. É pensar que o taxista ou cara do tinder pode ser um estuprador serial killer. É saber que se corre mais riscos do que um homem ao viajar sozinha. É ter de explicar a um homem a diferença entre assédio e elogio.
Hoje sei que as mulheres ainda são desrespeitadas em seu ambiente de trabalho, sei que elas ganham menos que os homens e que a cada segundo, milhares de mulheres são violentadas no mundo todo. Hoje eu sei que as mulheres negras são o grupo em maior desvantagem sob todas as perspectivas sociais, ao comparar-se às mulheres brancas e aos homens em geral. Mas sobretudo, hoje sei que qualquer mulher pode fazer qualquer coisa que se dispuser a fazer."""

quinta-feira, 10 de março de 2016

Mulheres

Hoje quem diz "O que  ser Mulher?" é Karina Fasson, com 27 anos é mestranda em Sociologia. Karina que já é socióloga, deixou para trás uma carreira na iniciativa privada para dedicar-se à dissertação de mestrado em que trata de relações raciais no ambiente escolar. Para ela o discurso feminista precisa ser uma prática cotidiana.

"O que é ser Mulher?" por Karina Fasson 



"Ser mulher anda difícil: uma luta constante e cotidiana. Pra mim, o pior dos machismos é aquele dissimulado, que, por vezes, demoramos a entender. O namorado que parece tratar bem e apoiar, mas na primeira demonstração de força da namorada, a coloca pra baixo e a diminui por não conseguir ter a mesma coragem que ela diante da vida. O cara com uma vida pública lutando por pautas progressistas, mas que trata mulher como objeto. O outro cara que compra livro sobre feminismo, mas também trata mulher como objeto. A menina que se diz feminista, fala que as mulheres tem que se unir e que a culpa é sempre dos homens, mas que, quando vai ver, está disputando homem por aí como se as mulheres fossem inimigas.
Espero e luto todos os dias para que ser mulher signifique mais igualdade e respeito por parte dos homens, e mais sororidade por parte das mulheres."        

quarta-feira, 9 de março de 2016

Mulheres

"O que é ser Mulher?" por Fran Santos

Para responder "O que é ser Mulher?", Fan Santos de 29 anos, que também é YouTuber, gravou um vídeo para compartilhar aqui no Alternnativa. Analista de pesquisa, trabalha há mais de dez anos na mesma empresa, é esposa, mãe, filha e irmã. Conheceu seu marido ainda na adolescência, por quem se apaixonou.
Fran resume o significado de ser mulher em uma palavra: Guerreira.       
                         
                        Acesse o canal da Fran clicando aqui.

terça-feira, 8 de março de 2016

Mulheres

Perguntamos "O que é ser Mulher?" à Talita Amaro, paulistana de 25 anos, ex-moradora da Cidade Tiradentes, já frequentou os cursos de História e Ciências Sociais, porém os interrompeu para cursar medicina com bolsa integral. Desde 2011 está a frente da coordenação geral do Cursinho Mafalda, projeto social que oferece anualmente, sem mensalidade, mais de 1.000 vagas distribuídas entre cursos de idiomas, pré-universitário, EJA - Enem, etc.  
Talita não consegue falar sobre Mulher, sem recorrer as diversas referências que teve ao longo da vida, referências as quais a fizeram ser a Mulher que é hoje.

"O que é ser Mulher"? por Talita Amaro 

FreeImages.com/Marcelo Moura

"Atendendo ao pedido de um amigo de longa data, escrevo aqui, o que é ser mulher em minha experiência pessoal.
Minha vida sempre foi bastante feminina, no sentido de ter sido sempre acompanhada por mulheres. Não por eu ser lésbica, mas porque minhas grandes referências são mulheres. Tanto nas artes, na academia quanto na vida cotidiana.
Sou de uma família que tem a presença forte das mulheres. Minha mãe é uma mulher forte, baseio minha força no que ela reflete. Minha avó era uma mulher muito especial, pois tinha espiritualidade aguçada, o que sempre me fez ser um pouco mais conectada ao que há de paralelo ao mundo material, embora invisível. Minhas professoras de nível básico, desde a pré-escola até o Ensino Médio, sempre me acompanharam, impulsionaram e forneceram a base educativa para que eu ingressasse no ensino superior. Fui uma aluna sortuda.
Ao ingressar na universidade e iniciar a prática política, tive muitas mulheres ao meu lado, muitas me ensinando sobre militância, muitas dando exemplos pelos atos e muitas construindo reflexões que mudaram meu olhar para diversas questões. O que, por um lado, me ajudou, pois hoje sou menos boçal do que já fui, mas que por outro lado me atrapalhou: pois estou cada vez menos sociável – ao passo que não tenho facilidade em conviver com pessoas reacionárias. Em minha vida atual tenho uma mulher ao meu lado, uma companheira, inteligente, linda, amável e muitos outros adjetivos difíceis de dizer em um texto. Ela me ajudou, me lapidou, me ensinou e ensina a ser alguém cada vez mais adequada ao mundo que desejamos colaborar para construir.
Enfim, não sei se respondi a questão proposta, mas para me falar mulher, tive de recorrer a muitas lembranças e recordações e dizer a partir de quais mulheres me tornei quem sou hoje."

segunda-feira, 7 de março de 2016

Mulheres

                  Mulheres por Mulheres

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Nesta semana é comemorado o Dia Internacional da Mulher, nós do Alternnativa não poderíamos deixar esta data passar em branco de forma nenhuma. Nós que aqui tentamos construir reflexões contrárias ao preconceito, em uma luta pela não opressão às minorias e grupos historicamente segregados na sociedade.
Que façamos deste dia um momento de reflexão que se projete para o ano todo, que a cada dia, mulheres alcancem igualdade e liberdade, que o machismo não mais cale, violente e asfixie as vozes que durante centenas de anos permaneceram oprimidas e silenciadas. Hoje e sempre, que a voz sejam delas, começando agora. 
O Alternnativa perguntou "O que é ser mulher?" para algumas mulheres, a resposta você acompanha aqui durante a semana.         
A primeira Mulher a nos responder é Maíra Meyer, ela é revisora e tradutora, tem 35 anos  e se considera feminista.

"O que é ser Mulher?" por Maíra Meyer

"Ser mulher é lutar pela própria visibilidade. Pela própria voz. Para que não lhe calem nunca a voz. É descobrir o significado profundo da palavra sororidade, e, sobretudo, aplicá-la na prática. Senti-la. É saber que, desde o princípio, todas nós somos irmãs. É persistir sempre na batalha, interna e em grupo, a favor de um mundo mais justo para todos os seres humanos. É reverenciar o Sagrado Feminino e andar lado a lado com a Divindade que há em cada uma de nós."

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Imposições Sociais

Oi pessoal! Mais uma semana com publicação aqui no Alternnativa, não queremos criar falsas expectativas, mas ao que tudo indica iremos conseguir estabelecer nosso plano de postar material a cada quinze dias, sempre às quartas-feiras.
Hoje trazemos um texto que discute mais uma vez as imposições sociais ligadas ao gênero e à sexualidade, o texto resgata algumas discussões já feitas em outros momentos aqui no blog e avança um pouco mais, para abrir espaço às futuras reflexões que faremos.
Gênero e Sexualidade como Imposições Sociais

Imagem: www.sertaonahora.com.br

Ao nascer chegamos a um mundo e a uma sociedade que já estão edificados, nosso papel de construção e mudança é, a princípio, restrito, porque uma gigante parte dos elementos que farão ou deveriam fazer parte de nossa personalidade já estão dados e pouco poderá ser modificado.
Dois destes elementos dizem respeito a nossa sexualidade e ao nosso gênero, os que nascem com vagina são socialmente mulheres, que devem se relacionar amorosa e sexualmente com homens; paralelo similar vale para os que nascem com pênis, socialmente homens, devendo relacionar-se com mulheres. São elementos que aos olhos de nossa sociedade heteronormativa são tão naturais e inatos quanto nossas digitais.
 O processo social do qual somos herdeiros não permite divergência, alternativa ou mudança, entretanto, o mesmo processo não leva em conta que o ser humano é um complexo inexplicável de sensações, sentimentos, pensamentos e contraditoriedades, tornando impossível a simples determinação de sua sexualidade pelo outro, pela sociedade ou ainda por uma parte isolada de seu corpo físico.
O homossexual, o trans, o não-binário (temos consciência de se tratar de características ligadas a orientação sexual e a identidade de gênero)  sentem-se diferentes desde muito cedo, não à toa, é comum ouvirmos coisas do tipo:

 - Ele nunca gostou de brincar com carros, preferia as bonecas.
 - Quando ela era pequena vivia no meio dos "moleques", odiava laços no cabelo, brincos, vestidos, ou coisas assim.
-  Ah, ele era diferente desde pequeno.

 A diferença emerge no momento em que o indivíduo não consegue se ver enquadrado nos modelos sociais institucionalizados, os quais ele deveria incorporar. Distanciando-nos de qualquer reducionismo simplista é preciso deixar muito bem claro que nem sempre a pessoa homossexual não se identificará com os elementos atribuídos socialmente ao gênero em que ela foi designada ao nascer. Há mulheres cis lésbicas que brincaram com bonecas, usaram e usam roupas socialmente tidas como femininas, ou homens cis gays que brincaram e se identificaram/identificam com os elementos atribuídos, socialmente, a ele, como o futebol, por exemplo, isso só afirma a complexidade e o quão é difícil enquadrar as pessoas, de forma ampla, em classificações rígidas e cristalizadas. Estamos muito longe de ser elementos estáticos e classificáveis, tais quais os que encontram-se organizados na tabela periódica.
O horizonte que devemos vislumbrar e lutar para que a sociedade também o vislumbre é aquele que permite a liberdade de vivência individual, não precisamos, na verdade não devemos partir dos princípios que determinam as formas como cada indivíduo deve portar-se. O caminho natural poderia ser o da livre descoberta, da livre aceitação e do livre reconhecimento de si mesmo. Antes de podermos entender quem somos, nossos médicos, nossos pais, nossa religião, nossa escola e nossa sociedade já nos definiu, já nos sonhou, planejou e nos realizou. Em última instância já somos a realização do sonho do outro, o que torna bastante problemático o momento em que decidimos ter nossos próprios sonhos e seguir nossa própria identidade, especialmente quando tais sonhos e identidade estão muito distantes daquilo que foi esperado de nós.
A questão do sonho dos outros é extremamente complicada e pode gerar uma série de conflitos e problemas, não só no âmbito da sexualidade e gênero. Não é incomum a problemática que se estabelece entre pais e filhxs quando, por exemplo, há uma discordância em relação ao curso superior que estes irão escolher, por exemplo.  Se levarmos o mesmo raciocínio para o campo da sexualidade e do gênero, temos uma ideia do quão pode ser difícil e trágico o entendimento de tal situação, justamente porque nossa sociedade não admite sob hipótese alguma tais possibilidades. Infelizmente nos deparamos com esta intolerância e falta de entendimento na figura de nossos pais, familiares, amigos, colegas, etc., e o processo de entendimento ainda é, em boa parte dos casos, doloroso e traumático.
Felizmente o mundo tem caminhado por uma estrada que tem aberto diálogos, maiores entendimentos, possibilidades de reflexão mais profunda e hoje, apesar de diversas limitações promovidas pelo pensamento conservador, intolerante e preconceituoso, conseguimos promover debates acerca da sexualidade, do gênero, das identidades e não há dúvida de que o debate hoje no século XXI, está bem distante do vivenciado na década de 1950 ou 1970, entretanto, ainda temos muito a avançar e construir, esta luta não pode parar, precisa permanecer firme, pelo menos até o dia em que ninguém morra ou se fira por ser lésbica, trans ou gay. Até o dia em que entender-se homossexual ou trans não signifique trilhar um caminho árduo, repleto de pedras, obstáculos, agressões, assassinatos ou mesmo suicídio, como infelizmente ainda ocorre.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

Machista II

O Super (gay) Machista
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Diante de intolerância e preconceito a reação esperada é uma contra-argumentação sólida e coesa por parte dos atingidos por este tipo de violência. Não é nenhuma exclusividade, nem assunto novo por aqui falar sobre homofobia e o massacre, nem sempre físico, que ela empreende dia a dia. Mas o que dizer e sentir quando esta homofobia vem de indivíduos que deveriam no mínimo construir um discurso e reflexão contrários a ela? O que pensar quando um gay é machista?
Sabemos que a opressão é seletiva relacionando-se especialmente à classe, ao sexo, ao gênero, à cor da pele, dentre tantos outros critérios, há uma hierarquia entre as pessoas e o grau de opressão que as atinge, o que nos permite dizer que a mulher cis hetero branca de classe média não é oprimida da mesma forma e intensidade que a mulher cis, hetero, preta de classe média; ou que o preconceito que recai sobre o homem cis, homossexual, branco de classe média também não é o mesmo sofrido pelo homem cis, homossexual, preto e pobre. Entre as diferenças o grau de opressão se intensifica, porém o mais abominável é constatar que em alguns casos o oprimido toma o discurso do opressor e passa a fazê-lo indiscriminadamente, produzindo ainda mais preconceito, reproduzindo homofobia e promovendo ódio, isso acontece em diferentes circunstâncias.
Algumas posições fornecem determinados privilégios, por exemplo, o gay branco de classe média  se encontra em uma situação que pode distanciá-lo -ao menos aparentemente- da luta em que ele, mesmo sem querer, está inserido, que diz respeito à conquista de direitos e dignidade aos homossexuais, não faltam exemplos práticos e caricatos em nossa sociedade. Provavelmente você já deve ter ouvido algo do tipo: " - Sou gay, mas sou discreto."; "- Não curto afeminados.", "Ser gay tudo bem, agora querer ser mulher é demais." etc. Todas estas falas podem vir ou mesmo já vieram de homossexuais, que tomando um discurso preconceituoso discriminam aqueles que deveriam ser aliados ou companheiros de luta. O discurso pode ser ainda pior em relação as lésbicas e pessoas trans.
Não queremos dizer que é apenas o homem gay branco, cis de classe média que possui tal pensamento e atitude, longe disso, na verdade ele é espalhado por todos os âmbitos do meio LGBT, mas nesse caso há uma situação privilegiada usufruída por essas pessoas. Posição confortável ao ponto de não fazer sentido a elas falar em preconceito ou luta por direito e dignidade, se estivermos falando de um homossexual não bem resolvido com sua sexualidade, o cenário piora.
O quadro desenhado acima acaba por gerar uma das figuras mais contraditórias, a nosso ver, no meio LGBT, o gay machista, aquele que não se vê enquanto gay, menos ainda como LGBT, aquele que irá oprimir o afeminado, o trans, em não poucos casos, as lésbicas e compartilhar de discursos e atitudes próprias de homofóbicos, nem precisamos ir muito longe para chegar onde pretendemos, basta mirar na figura do deputado federal Jean Wyllys. O Jean se tornou um dos maiores políticos engajados na luta pelos direitos LGBT, mas não só, devido a isso, tornou-se alvo fácil e frequente de diversos políticos conservadores, machistas, preconceituosos e como o próprio Jean menciona em alguns casos, fascistas, assim, como da sociedade em geral.
Ao analisar o contexto em que se construiu e vive a sociedade brasileira, uma democracia recente, é bom lembrar, não seriam novidade os ataques que recairiam sobre a figura do deputado, mas a surpresa fica por conta dos inúmeros gays declarados que se posicionam contrários a política feita por Jean, claro que todos têm o direito de apoiar e criticar quem quer que seja. Não se deve apoiar um político, apenas por ele ser gay, preto, branco, católico, evangélico, de origem rica ou pobre, etc., mas sim pelas propostas deste para com a população, no  entanto, é de se esperar um mínimo de consciência crítica, especialmente por parte das minorias, como é o caso dos homossexuais, na hora de eleger seus representantes, lembrando que vivemos em um dos países que mais mata travestis e transexuais
Jean Wyllys é caluniado frequentemente, os absurdos vão desde afirmações que dizem que ele quer alterar a bíblia até ser a favor de se destruir a figura de pai e mãe, claro que cada acusação e calúnia é muito bem voltada a interesses específicos, mas isso é assunto de outro momento, o que nos interessa é observar como diversos gays acabam por reproduzir tal discurso e oprimir ainda mais outros gays ao tentar se colocar em posição de superioridade com base em sua posição social ou não, durante certa ocasião em uma entrevista veiculada por uma emissora de TV aberta, um individuo gay teceu inúmeras críticas infundadas ao Jean, o desqualificando enquanto pessoa, enquanto deputado e enquanto gay; o mesmo indivíduo fez um discurso bem diferente sobre a pessoa de Silas Malafaia quase convidando-o para um café. Diante de tal quadro fica evidente a forma como a homofobia é interiorizada pelo próprio homossexual, em alguns casos, pelos mais diversos motivos, entretanto o fundamento é quase sempre o mesmo.

A identificação enquanto homossexual falta, a conscientização dos papéis sociais falta, a politização necessária enquanto indivíduos indiscutivelmente oprimidos também falta, sendo substituídas por um entendimento raso do mundo circundante, o gay se exime da luta, se exime da homossexualidade e do sangue derramado, para estar no lado que oprime e faz sangrar, na busca, de não sabemos o quê. 

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Padrões Sociais

Hoje não, Sociedade!
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Há em nosso mundo uma série de condicionantes para a vida em sociedade. Desde muito cedo, a vivência e o processo de socialização, do qual também somos fruto, incute em nossa mente um sem número de desejos e aspirações, muitas vezes, estranhos a nós.
Para aqueles que não conseguem escapar ao rolo opressor da cultura ocidental, machista, branca, heteronormativa, e acrescentamos também romântica, solidificam-se na mente e no imaginário alguns pré-conceitos, idealizações e sonhos, que podem não ser necessariamente da pessoa em questão, mas antes os sonhos que a sociedade, de maneira ampla, sonhou para e por ela.
O amor romântico, o casal do comercial de margarina, dos finais da novela das seis, dos filmes holllywodianos e tudo mais que está embutido nesse contexto é a nosso ver, um dos produtos mais bem sucedidos dessa cultura, tão bem difundido e amarrado a necessidade individual e social de cada pessoa inserida nesse mundo, que a torna automaticamente um ser estranho, problemático e, principalmente, infeliz, caso ela não consiga alcançar a maior promessa histórica de felicidade: o amor. Amor cristalizado na figura do outro, o qual traz consigo uma das maiores buscas do ser humano contemporâneo: A felicidade e felicidade para sempre.
Afinal, amar é mesmo para todos? A felicidade está no amor? Felizes para sempre não seria apenas uma criação ilusória de fuga, difundida pelos encantadores e encantados contos de fadas, criados apenas como mais um mecanismo de controle social e/ou reprodução do capital sob diversos aspectos?
Um questionamento no mínimo complexo e problemático, para não dizer descabido, pois parece não haver necessidade nenhuma de discutir os mecanismos capazes de trazer a felicidade, menos ainda se estes mecanismos se aplicam a todos de maneira uniforme, já que parece ser universalmente aceito que a felicidade está mesmo no amor e todos precisam encontrar sua metade, senão a tristeza e a busca permanentes parecem ser o destino desses. Nossa visão e percepção de mundo é permeada pelos valores sociais e culturais da sociedade em que vivemos, a busca pelo amor romântico e o condicionamento da felicidade a ele é um desses valores.
A busca pelo amor se torna objetivo de muitos, entretanto, é preciso ter em mente que cada pessoa pode e deve ter o direito de empreender as próprias buscas e estabelecer os próprios objetivos de vida, sem isso significar uma frustração ou motivo para dizer que determinada pessoa jamais será feliz por não ter encontrado alguém para partilhar a vida, talvez esse objetivo nunca tenha passado pela cabeça dela.
Determinadas cobranças parecem nunca acabar: E xs namoradxs? E o casamento? E xs filhxs? Cada pessoa tem (ou, ao menos, deveria ter) o direito de estabelecer as próprias prioridades. Entre as quais, namorar, casar-se ou mesmo ter filhxs pode não ter lugar. A infelicidade não deve estar na ausência do outro, porque cada um precisa ser capaz de ser feliz sozinho primeiro, apenas assim, uma segunda vida pode fazer sentido.
Certos padrões e verdades precisam ser questionados, pois a vida não deve seguir rígidas linhas ou os desejos que outros depositaram sobre nós. A construção de preconceitos segue a mesma lógica, pois esse é gerado pelo estranhamento aquilo que não segue um determinado padrão esperado. Uma mulher que deliberadamente decide não se casar ou ter filhxs, gera esse estranhamento porque "é natural à mulher que ela seja mãe", percebam que o mesmo estranhamento não ocorre com a mesma dimensão em relação ao homem, entretanto, caso ele, por qualquer motivo que seja, não estabelecer um relacionamento com uma mulher (caso ele seja hétero), o questionamento será: "Tal fulano está sozinho nessa idade, será que é gay?".
Dificilmente o pensamento em relação a esses indivíduos irá centrar-se na hipótese de que eles possam ter escolhido livremente não ter ninguém ao lado, em vez de significar, necessariamente, que não houve pessoas dispostas a amá-los ou vice-versa.
Mais uma vez estamos em uma questão trabalhada em outros momentos aqui, trata-se da liberdade individual em poder escolher como caminhar, como viver, sem os pré-julgamentos ou necessidades sociais para com nossas vidas. Cada indivíduo precisa ter a liberdade de fazer suas escolhas, sejam elas quais forem. Namorar, noivar, casar, ter filhos, enfim, cada uma dessas etapas não são uma necessidade universal de felicidade. Cada um encontra, ou ao menos deveria encontrar, a felicidade à sua maneira.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Cuatro Lunas

Oi gente's, tudo bem com vocês?
Como há muito não postamos nada sobre cinema, hoje trazemos uma sugestão ótima para aquela noite ou mesmo para o fim 
de semana. Assistimos "Cuatro Lunas" e ficamos encantados com o enredo e a produção. Leia nosso breve comentário, assista ao filme e volte para deixar sua opinião.
Cuatro Lunas
Um drama sincero




Filme de 2014, Cuatro Lunas foi dirigido por Sergio Tovar Velarde. Em alusão clara às quatro fases da lua, o filme retrata o cotidiano de quatro indivíduos homossexuais, cada qual vivendo sua vida, enfrentando seus problemas e tendo de lidar com as contraditoriedades encontradas pelo caminho, as histórias são independentes e não se cruzam no roteiro.
Velarde dirige um drama que não escorrega no exagero, faz romance sem cair em estereótipos ou clichês, retrata desejo sem deixar de lado a humanidade, consegue trazer histórias já conhecidas com sabor de descoberta. É assim que "Cuatro Lunas" prende o expectador. De forma delicada e singela, mostra que antes de qualquer questão, somos humanos e como tais, estamos sujeitos a erros, a acertos, a escolhas equivocadas, a chorar e a lidar com as consequências de nossos passos.
Qual a reação de um jovem que, descobrindo a sexualidade, sente-se atraído pelo primo? As dúvidas sobre o corpo e os próprios desejos se intensificam, o primo que é a pessoa do mesmo sexo de maior proximidade se torna a possibilidade da descoberta e fica claro que a lua nova marca este momento, a questão não é amor ou um sentimento profundo ligando uma pessoa à outra, trata-se antes do novo, da doce descoberta da sexualidade e o turbilhão de sensações que o momento traz a cabeça e à vida de um indivíduo.       
Quarto crescente fala de reencontro, fala de entendimento. Trata-se de um coincidente reencontro de dois amigos de infância que descobrem um sentimento além da amizade entre eles. Os problemas vêm de ambos os lados, um deles perdeu o pai, a mãe está desestruturada, inclusive para ouvi-lo, e para piorar, a situação econômica deles não é favorável. O outro vive no armário e tem uma noiva para enganar aos outros e a si mesmo. O que pode ocorrer quando os dois se apaixonarem? Será que haverá estrutura para que a relação floresça ou tudo acabará onde começou, na despretensiosa descoberta de um sentimento mútuo que pretendia crescer em uma noite de lua no quarto crescente?
A felicidade é mesmo uma receita a ser seguida? Um relacionamento estável, aproximadamente dez anos, uma casa -o lar-, a companhia, amigos em comum, o filme no final de semana etc., são as características de um casal, aparentemente, em momento de felicidade? O filme apresenta a história de Andres e Hugo, que a primeira, bem primeira vista, parecem felizes, mas que aos poucos dão sinais de que a relação vem se desgastando há tempos, e acompanha o empenho de apenas um dos envolvidos em não deixar que a lembrança do amor que um dia os uniu se apague por completo. Lua cheia fala de desgaste, de fim de ciclo e claro, da dor que inevitavelmente acompanha esse processo. Nós, expectadores, acompanhamos a deterioração de um relacionamento ao ponto de nos questionar se tudo que um dia possivelmente tenha contribuído para que o amor florescesse se tornou responsável para que ele, de igual maneira, termine, ao mesmo tempo em que o autor nos traz a hipocrisia, tão vivida em relacionamentos desgastados. Despedir-se, desfazer-se, admitir o fim dificilmente é uma tarefa fácil. Mas até que ponto o salvamento de algo impossível de ser salvo se justifica?
Há inúmeras pessoas que jamais conseguem se libertar e viver plenamente sua sexualidade, em boa parte dos casos os mais afetados e machucados com essa atitude são elas mesmas, que na decisão por sustentar mentiras, fazem brotar verdades que o passar das décadas cuida por solidificar na mente e no imaginário dos envolvidos. Em alguns casos, parece que a mentira deixa de existir e a verdade, bem, a verdade se torna uma prisão impenetrável. Você está sentado à mesa e partilha com a família sua vida; você tem esposa, filhos, netos, uma carreira modesta, entretanto respeitada e, apesar de ter conseguido o respeito de todos, não conseguiu respeitar a si próprio, prova disso é sua busca incessante por satisfazer os desejos arrastados para debaixo do tapete constantemente. Joaquín é um senhor que míngua por sexo e acaba conhecendo um garoto de programa por quem nutre um desejo, mas encontra dificuldade para conseguir o dinheiro cobrado por ele. Quarto minguante marca a escassez de diversas coisas, talvez a principal delas, seja amor próprio.