HIV: A Entrevista
FreeImages.com/Artist's do
Nom David Dallaqua
Como antecipamos na semana passada em nossa
Fanpage, o Alternnativa traz hoje entrevista exclusiva com uma pessoa portadora
do HIV. Anonimamente, ela nos conta como foi descobrir ser portadora, encarar os
familiares, ter tido filho, começar o tratamento e acreditar que sobreviveria,
em um momento que via diversas pessoas falecendo com de Aids.
Adelaide (nome fictício) bateu um papo
descontraído com o Alternnativa e, de maneira descontraída, vamos expor os principais trechos distribuídos nos tópicos que nortearam nossa
conversa.
Ela
começa nos falando sobre a descoberta.
Adelaide se descobriu portadora há vinte anos, ao fazer os exames de rotina durante a segunda gravidez, o primeiro filho não
adquiriu o vírus. Hoje, aos quarenta e quatro anos de idade, vive bem e feliz. Afirma ela, não ter nenhum efeito colateral com os medicamentos administrados
atualmente, bem como nenhuma complicação decorrente de sua condição. Adelaide é
o tipo de pessoa que porta o vírus (HIV), mas não desenvolveu a doença (Aids).
O
que mudou, de fato, em sua vida após o diagnóstico?
"Parecia que o mundo ia
acabar". É assim que Adelaide
começa falando sobre esta questão. Ela nos diz que o choque inicial é bastante
conturbado, a princípio pensou que poderia morrer logo, pois via constantemente
na mídia, casos de pessoas que vinham perdendo suas vidas; ela citou Cazuza
como um caso bastante repercutido à época. Passado o choque e medo iniciais, a
rotina foi se normalizando, a grande mudança foi a administração dos remédios,
cuja adaptação foi bastante complicada, com severos efeitos colaterais no
início.
Em
alguns momentos é necessário compartilhar alguns fatos de nossa vida com outras
pessoas. Você precisou contar à alguém? Como foi o processo?
Há vinte anos, o preconceito -causado também
pelo desconhecimento- era maior. Adelaide conta que teve muito medo de perder o
marido e isso a deixava ainda pior, mas diz que em nenhum momento ele
demonstrou qualquer sinal que apontasse nessa direção, pelo contrário, a todo
momento fazia questão de deixar claro que eles estavam juntos e era, assim, que
as coisas iriam permanecer. Ela segue falando que não foi fácil contar aos
familiares e chegou a ouvir, de forma não direta, comentários preconceituosos; mas, que com o tempo, as pessoas foram entendendo melhor do que se tratava a sua
condição.
Perguntamos
à Adelaide como ela percebe o preconceito em relação aos soropositivos e o peso
dele em sua vida.
O Alternnativa tem como missão fundante
combater o preconceito e nós sabemos que, apesar dos avanços científicos em
relação ao HIV e a Aids, o preconceito está aí e é sim um peso para milhares de
pessoas que convivem com o vírus. Adelaide diz que ela percebeu sim este
preconceito, que no passado ele era ainda maior, pois poucas pessoas tinham acesso à informação como hoje, não havia campanhas de conscientização amplas e
difundidas, os estudos ainda estavam em fase de amadurecimento. "O peso
do preconceito somava-se ao peso de saber ser portador". completa ela.
Sabemos
que a aids ataca o sistema imunológico daqueles que a desenvolvem, em termos
práticos não é possível dizer que alguém morreu de aids, e sim de outros vírus
oportunistas que atacam a pessoa, que com o sistema imunológico deficitário,
vai à óbito. Você teve algum tipo de complicação ou adquiriu algum vírus
oportunista?
Adelaide diz que conviveu bastante tempo com
o vírus até descobrir ser portadora, sem jamais ter desenvolvido qualquer
sintoma que apontasse haver algo de errado. Também não transmitiu o vírus para
seu atual companheiro.
Pedimos
que Adelaide contasse um pouco sobre o tratamento.
Ela nos diz que o começo foi bem doloroso,
precisou ir inúmeras vezes, no meio da noite, à prontos-socorros devido às intensas dores, sem poder jamais interromper o tratamento. Quando ela descobriu
ser portadora, os medicamentos ainda eram escassos e não havia uma variedade de
opções; à medida que o tempo foi passando novos medicamentos foram surgindo e o
organismo começou a se habituar, o que possibilitou uma maior adaptação. Ela
comenta que chegou a tomar 23 comprimidos diários, entre vitaminas para se
fortalecer e os remédios para combater o HIV, hoje ela toma 6 (três pela manhã
e outros três à noite) e diz não sentir
absolutamente nada.
Comentamos
com Adelaide, que o Brasil faz parte do estudo da PrEP (Profilaxia pré-exposição),
que pretende barrar a infecção pelo HIV de pessoas com sorologia negativa,
através da administração do Truvada. A pessoa toma diariamente um
comprimido; estudos têm demonstrado ser o remédio, eficaz contra a infecção.
Perguntamos à ela sua opinião sobre isso, e se caso soubesse da existência de
algo do tipo antes de ter contraído o vírus, se faria uso.
Adelaide se mostra uma pessoa aberta ao dizer
que apoia qualquer tipo de iniciativa que ajude a combater novas infecções e
derrubar preconceitos; segue dizendo que usaria o medicamento, caso houvesse
algo do tipo disponível antes de contrair o vírus.
Como
nossa conversa não foi necessariamente linear, há outros pontos importantes que
não foram citados nos tópicos acima. Resumimos abaixo.
- Adelaide nos disse que no início do tratamento, sua carga
viral custou a baixar e que foram anos de tratamento até chegar a condição de
carga viral indetectável.
- Junto ao tratamento médico, ela fez terapia e
nos disse ser fundamental este tipo de acompanhamento, especialmente para que a
pessoa possa se localizar e entender melhor sua condição. Ela conta que sua
situação a deixou bastante deprimida (medo de perder o marido, como ela viu
acontecer inúmeras vezes com outras mulheres portadoras, medo de não ver o
filho crescer, o preconceito das pessoas etc.); o acompanhamento psicológico
a reanimava a cada visita.
- Adelaide engravidou pela segunda vez, mas a filha adquiriu o vírus
e faleceu de complicações posteriores.
- Adelaide diz que os médicos admiram seu caso,
pois mesmo sendo portadora e com a carga viral elevada, não demonstrou nenhum
sintoma nem transmitiu o vírus para o seu companheiro com quem manteve relações sexuais desprotegidas, até a descoberta do HIV. Recentemente seu sangue foi colhido para
exames, mas ainda não obteve retorno.